Por Larissa Mota, CEO do grupo Exímia
Nos últimos anos, a contratação de profissionais como Pessoa Jurídica (PJ) ou Microempreendedor Individual (MEI) se tornou prática recorrente no Brasil, principalmente entre empresas que buscam reduzir custos e aumentar a flexibilidade de suas operações. Em 2024, o país alcançou 15,5 milhões de MEIs ativos, segundo o Sebrae, um número que reflete não apenas o empreendedorismo, mas também a adaptação forçada de muitos trabalhadores à informalidade disfarçada.
Embora a pejotização seja legal quando usada corretamente — em relações comerciais autônomas —, sua aplicação tem sido distorcida em muitos casos. Profissionais atuam com rotina fixa, subordinação, metas e controle de horários, mas sem acesso a direitos trabalhistas garantidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Férias remuneradas, 13º salário, FGTS e estabilidade se tornam benefícios inalcançáveis. Essa configuração cria dois conjuntos de riscos importantes: para o trabalhador e para o empregador.
Do lado do trabalhador, os riscos são claros e preocupantes: falta de garantias sociais, insegurança financeira diante de doenças, gravidez ou demissão, dificuldade de acesso a crédito, aposentadoria reduzida e maior vulnerabilidade em um mercado já competitivo. Frequentemente, o profissional se vê compelido a aceitar condições que jamais escolheria em um cenário de maior proteção, o que aprofunda o desgaste emocional e compromete a estabilidade da carreira.
Para as empresas, o risco é jurídico, financeiro e reputacional. A informalidade disfarçada pode resultar em reconhecimento judicial do vínculo empregatício, com cobrança retroativa de encargos, multas e indenizações. Além disso, a prática pode comprometer a imagem da empresa perante o mercado, dificultar a atração de talentos e gerar conflitos internos, especialmente em ambientes com equipes mistas (CLT e PJ). O uso indiscriminado da pejotização também enfraquece a cultura organizacional e mina a confiança dos profissionais.
Segundo dados da PNAD Contínua do IBGE, 39% da força de trabalho brasileira está na informalidade. Parte desse índice se deve justamente a modelos de contratação que não reconhecem vínculos empregatícios. A pejotização, quando mal aplicada, é um exemplo claro de como a busca por “flexibilidade” pode escamotear a precarização das relações de trabalho — comprometendo não só a proteção social dos trabalhadores, mas também a produtividade, o clima organizacional e a reputação das empresas.
Para mudar esse cenário, é essencial que empresas adotem práticas de contratação mais responsáveis e juridicamente coerentes. Se a relação de trabalho é contínua, com subordinação e habitualidade, o vínculo precisa ser formalizado conforme a CLT. Nos casos em que há real autonomia e prestação de serviços com liberdade técnica e de agenda, contratos de PJ podem ser legítimos, mas ainda assim devem prezar por transparência, equilíbrio e respeito mútuo. Paralelamente, políticas públicas que estimulem a formalização e ampliem a fiscalização são fundamentais para conter o avanço dessa informalidade estrutural.
Valorizar o trabalho formal não é apenas uma exigência legal, mas uma estratégia inteligente de gestão. Empresas que respeitam os direitos dos seus profissionais constroem ambientes mais estáveis, atraem talentos e contribuem para uma economia mais justa e sustentável. É preciso deixar de enxergar o trabalho como custo e começar a vê-lo como investimento.
*Larissa Mota é advogada, especializada em Relações Trabalhistas e Sindicais pelo Centro Universitário Braz Cubas. Em 2005, fundou a Exímia, BPO especializada em terceirização de folhas de pagamento e gestão de benefícios.